quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Textos Carla Faour

MÚSICA: DOCE VAMPIRO

CENA: VAMPIRO MUTANTE.

PERSONAGENS: JÔ, MEG E DIMITRI.

CENA 1 - SPA. HALL DE ENTRADA. DUAS AMIGAS SE ENCONTRAM.

MEG - Jô!

JÔ - Meg!

MEG - Tenho te ligado tanto. Você não me retorna.

JÔ - Desculpa. Namorado novo.

MEG - Sabia. Tá perdoada.

JÔ - Ele tem uns horários diferentes. Ando trocando o dia pela noite.

MEG - Insônia?

JÔ - Malhação.

MEG MALICIOSA.

MEG - Malhação de “malhação”?

JÔ - Malhação de academia, Magali.

MEG - Ah. Você está ótima mesmo. Magérrima.

JÔ - Tô feliz, só isso.

MEG - Pele boa.

JÔ - A gente tem que se cuidar.

JÔ MEXE NO CABELO DEIXANDO O PESCOÇO À MOSTRA.

MEG - Ih, menina, o mosquito te mordeu no pescoço.

JÔ - Esses dois furinhos um do lado do outro?

MEG - Cuidado com a dengue.

JÔ SORRI.

JÔ - Não foi mosquito, não. Foi ele.

MEG - Ele... O?

JÔ - O próprio.

MEG - Nossa, que animado.

JÔ - Uma loucura.

MEG - Mas ele exagerou no chupão. Te deixou toda marcada.

JÔ - O amor verdadeiro deixa marcas.

MEG – Hum. Me conta. Como é esse príncipe encantado?

JÔ - Nem sei explicar. Ele é... diferente. De todos os caras que eu já fiquei.

MEG - Parabéns.

JÔ - Só tem uma coisinha.

MEG – Ah. Eles têm sempre uma coisinha.

JÔ - Nada demais. Só um detalhe.

MEG - Casado?

JÔ - Não!

MEG - Mau hálito?

JÔ - Não!

MEG - É velho?

JÔ - Um pouco.

MEG - Quantos anos?

JÔ - Muitos.

MEG - Muitos tipo meu pai?

JÔ - Muitos tipo seu tataravô.

MEG - Cruz credo!

JÔ - Mas ele aparenta muito menos.

MEG - Menos quanto?Menos tipo seu bisavô?

JÔ - Menos tipo você.

MEG - Eu? Mas como pode? Quantos anos ele tem, afinal?

JÔ - Sabe que eu não sei? Ele esconde a idade.

MEG - Vaidoso, é?

JÔ - Ele é um vampiro, Meg.

MEG - Ele é o quê?!!

JÔ - Vampiro.

MEG - Você está de gozação com a minha cara!

JÔ - Nunca falei tão sério.

MEG - Tudo bem que as coisas estão difíceis, a oferta é escassa, a demanda altíssima. Mas convenhamos.

JÔ - Ele é incrível! Me faz tão feliz.

MEG - Ele é violento. Fica te mordendo.

JÔ - É carinho, Meg.

MEG - Você não toma jeito. Sempre teve uma queda por caras estranhos. Pelas minorias. Lembra aquela vez que você namorou um esquimó?

JÔ - Foi a maior fria.

MEG - Mas agora você se superou.

JÔ - Com ele não é só pele, Meg. Nós temos muito em comum, gostamos das mesmas coisas, compartilhamos os mesmos valores.

MEG - Você e o Vampiro?

JÔ - Dimitri. O nome dele é Dimitri.

MEG - Gringo, é?

JÔ - Romeno.

MEG - Romeno?!!

JÔ - O que você queria? Um vampiro africano?

MEG - E como vocês se entendem?

JÔ - Na língua universal, ué: mímica. Eu também arranho um pouco de inglês. Ele de espanhol. Conchita, a babá dele lá na Transilvânia, era paraguaia.

MEG - Transilvânia? Babá paraguaia? Só falta você me dizer que ele mora num Castelo?

JÔ - Como você adivinhou?

MEG - Jô, cai fora! Esse cara não é pra você.

JÔ - Você está sendo intolerante, Meg. O Dimitri só é... diferente.

MEG - Claro que é diferente. É um vampiro, porra!

JÔ - Ser vampiro é apenas um detalhe.

MEG - Olha como você está magra, ele está te vampirizando!

JÔ - Eu estou magra porque estou malhando! Aliás, nós dois.

MEG - Você e o conde drácula?

JÔ - Sem piadinhas. Dimitri é super saudável.

MEG - Saudável? Ele é um bebedor de sangue!

JÔ - Dietético.

MEG - Hã?

JÔ - O Dimitri não bebe sangue doce. Por isso eu aboli o açúcar.

MEG - Vampiro diabético. Essa é boa.

JÔ - Ele não é diabético. É dietético. Ele está de dieta.

MAGALI DEBOCHADA.

MEG - Qual? Do grupo sanguíneo? Desculpa, não resisti.

JÔ - Mas é isso mesmo. Dieta do grupo sanguíneo. E eu sou o tipo dele: A+.

MEG - Quer dizer que esse vampiro veio para o Brasil pra emagrecer e fazer turismo sexual?

JÔ - Agora você me ofendeu! O Dimitri é um cara sério. Ele veio ao Brasil pra fazer tratamento! Tá satisfeita?

MEG - Sabia que você estava me escondendo alguma coisa! O morcegão tá doente?

JÔ - Quem?!

MEG - Essa coisa de sangue é coisa séria, Jô. Olha que tem um surto de Hepatite B por aí. Você está se protegendo?

JÔ - Tratamento estético.

MEG - Do que você está falando?

JÔ - Foi isso que ele veio fazer no Brasil. Tratamento estético. Nós nos conhecemos aqui.

MEG - No SPA “Beleza integral”?

JÔ - Mais precisamente fazendo bronzeamento artificial. Ele adora. Diz que a câmera de bronzeamento lembra o caixãozinho dele da infância, lá na Transilvânia. Claro que mais quentinho. Ele diz que só falta a Conchita cantando “Guantanamera” pra ele. Não é uma graça?

MEG - É, realmente o Dimitri é...

JÔ - Diferente. Diferente e atrasado.

MEG - Ele tá vindo pra cá?

JÔ - Já devia ter chegado.

MEG – Até que enfim vou conhecer o dito cujo.

JÔ - Atrasadíssimo.

MEG - Homem que é homem não deixa mulher esperando.

JÔ - Pois eu esperaria por ele a minha vida inteira.

MEG - Só uma curiosidade. Ele vem voando?

JÔ - Você acha que é assim? Que ele sai voando toda hora? Não, só em ocasiões especiais. O vento resseca o cabelo.

MEG - Quer dizer que além de fazer dieta, malhar e fazer bronzeamento artificial, ele ainda cuida dos cabelos?

JÔ - Descobriu a manteiga de carité. Comprou centenas de potes pra levar pra Transilvânia.

MEG - Não diga? Contrabando é crime, sabia?

JÔ - Que horas são?

MEG - Duas.

JÔ - Já? Nós marcamos de fazer a sobrancelha...

MEG - Nós?

JÔ - Depois da depilação... Será que vai dar tempo?

MEG - Ele é daqueles que se depilam?

JÔ - Todinho.

MEG - Jô, será que você não percebe?

JÔ - Já sei. Você deve estar achando estranho, não é?

MEG – Imagina!

JÔ - Eu também demorei a me acostumar. Mas eu te digo que é normal. Hoje em dia eles são assim. Sofreram uma mutação.

MEG - Eu sou antiquada. Prefiro as coisas à moda antiga.

JÔ - Até concordo que antigamente eles eram mais charmosos, mais...

MEG - Viris...

Jô - Por outro lado, hoje em dia eu posso dividir com ele momentos como esse.

Meg - Como da depilação, por exemplo?

Jô - Momentos à luz do dia.

MEG - Você só me confunde!

JÔ - Essa nova geração que sofreu a mutação não tem problema com a luz do sol. Eles podem sair de dia, não precisam dormir de cabeça pra baixo e não tem problema nenhum com alho. São mais desencanados.

MEG - Quer dizer que o molho pesto tá liberado?

JÔ - Não é incrível? Ai, aí vem ele.

DIMITRI CHEGA. ELE ESTÁ BEM ARRUMADO E MAQUIADO.

DIMITRI - Jô, minha querrrida.

JÔ - Amor, você demorou. Quase morro de saudade.

JÔ ABRAÇA DIMITRI E, SEM QUERER, MEXE NO CABELO DELE. DIMITRI SE AJEITA.

JÔ - Amor, quero te apresentar uma amiga. My friend, Magali.

DIMITRI - Hello. Muita prrrrazer. Encanado.

JÔ - “Encantado”.

DIMITRI - What?

JÔ – “Encantado”, amor. É palavra certa.

DIMITRI - Perdon pelo português.

JÔ - All right. Tudo bien.

DIMITRI - E pelo atrrrraso. É que eu ficar na dúvida sobre qual roupa vestir. Eu experimentar quase todo o armário. O que você achar? Estou bien?

JÔ - “Mui guapo”. Tu non achas, Magali?

MEG - Hã?

JÔ - Ele quer saber se a roupa está boa.

MEG - La calcita está um pouco apertadita...

JÔ - Tá lindo, amor! A Magali acha que la calcita valoriza o bum bum.

DIMITRI - Perdon? Non compreendo.

JÔ - Valoriza. Lo bundon.

MEG E JÔ FAZEM MÍMICA

DIMITRI - Oh, si! Yes. Yes! Gracias! (T) Ohhh!

MEG - Ai, o que foi?

JÔ - Ele está olhando pra suas mãos.

MEG - Por quê?

JÔ - Ele é louco por mãos.

MEG – Jô, se ele chupar minhas mãos você me paga!

DIMITRI - Yo estoi mirando tuas. How can I say, this?

JÔ - Unhas.

DIMITRI – Unhas? Yo estoi mirando sus unhas. Magníficas! What color?

JÔ - Ele quer saber a cor do seu esmalte.

MEG - Eu preciso te dizer uma coisa, Jô. Esse vampiro é morcega.

JÔ - O Dimitri? Imagina!

MEG – Essas coisas todas de bronzeamento, depilação, sobrancelha. Isso não é coisa de homem!

JÔ - Claro que não! Isso é coisa de vampiro. Vampiro mutante. Coisa de homem é o que ele vai fazer agora.

DIMITRI VEM POR TRÁS E MORDE O PESCOÇO DE MEG.

DIMITRI - Hum. Doce!

JÔ - Você não estava de dieta, mi coraçon?

DIMTRI - Sorry, não resisti.

JÔ – Não te disse, Meg, que ele era...

MEG – Homem!

JÔ – Ser vampiro ou homem é apenas um detalhe. O que importa é que ele é... Diferente.

JÔ E DIMITRI SE BEIJAM. ENTRA A MÚSICA.

FIM.

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MÚSICA: IDEOLOGIA - carla faour

CENA: AQUELE GAROTO QUE IA MUDAR O MUNDO.

CENA 1 – SALA DA CASA. INT. DIA

MENINO BRINCA ENQUANTO A MÃE FALA AO TELEFONE.

PAULINHO - O Super Homem vai acabar com os bandidos! Pow! Pow! Pow!

MÃE - Estou tremendo até agora, Ricardo. Precisa ver a confusão que tá aqui na rua. Polícia, sirene... tão dizendo que ele estava encapuzado. Coisa de profissional, mesmo.

PAULINHO - Eu tenho super poderes!

MÃE - O Paulinho tá bem. Agitado, mas bem.

PAULINHO - Não tenho super poderes, mãe? Mãe! Manhê!

MÃE - Nessas horas é importante a figura do pai, pra dar segurança. Que horas você vai passar pra pegar ele?

PAULINHO - Manhê, eu tenho super poderes?

MÃE - Tem, Paulinho. Tem sim.

PAULINHO - Oba! Eu tenho super poderes!

MÃE - Não vem? Como assim, Ricardo? De novo? Não acredito!

PAULINHO - Super visão de raio x! Super força! Vou matar todos os meus inimigos! Arrancar a cabeça de todos eles! Estourar os miolos!

PAULINHO SOBE NOS MÓVEIS FAZENDO BARULHO DE TIRO.

PAULINHO – POW! POW!

MÃE - Desce daí! Não, Ricardo, estou falando com seu filho. Vem cá, onde você tá, hem? Que barulheira é essa? Ocupado? Sei! Sei muito bem qual é a sua ocupação. (p/ Paulinho) Já disse pra você descer! Você vai se machucar, menino! Eu não acredito que, justo hoje, você não vem buscar ele! É o fim da picada!

PAULINHO - Mãe, se eu me machucar o Super Homem vem me salvar?

MÃE - Se você se machucar a sua “super mãe” vai te levar pro hospital. Porque o seu pai... Ué, qual o problema? Eu estou mentindo, Ricardo? Ele só tem a mãe mesmo, por que o pai... Sabe há quanto tempo você não vê o Paulinho?

PAULINHO - Quem é mais forte, mãe? Meu pai ou o Super Homem?

MÃE - Com certeza o Super Homem. (p/ Ricardo) É por isso que ele está com problemas na escola. É a falta da figura paterna. Eu o quê? Estou colocando o seu filho contra você? Ah, me poupe! Ricardo, eu não quero discutir isso na frente do. Paulinho, vai pro seu quarto, vai meu filho.

PAULINHO - Mas por quê?

MÃE - Por que eu quero!

PAULINHO - Mas eu...

MÃE – Eu estou mandando. Vai estudar. Já fez o seu dever de casa? Vai fazer o dever de casa. (P/ Paulinho)

PAULINHO – Pôxa, mãe.

MÃE - Agora! (p/ Ricardo)

PAULINHO - Aposto que o Super Homem nunca estudou.

MÃE - Aposto que você não vem pegar seu filho porque tá aí na farra, não é Ricardo? Na galinhagem...

MÃE CONTINUA CONVERSANDO COM PAI AO TELEFONE. PAULINHO VAI PARA O QUARTO FALANDO.

PAULINHO - Vou matar todos os impostores! Todos! Um por um! Tchum! Tchum! Vou arrancar os olhos deles. De todos os ladrões e malfeitores!

MÃE - Você pensa que ele não percebe o que tá acontecendo. Como “o quê”? Tudo! Ele sabe que você não dá menor bola pra ele...

CENA 2 – QUARTO DE PAULINHO. INT. DIA.

PAULINHO ENTRA NO QUARTO E DÁ DE CARA COM UM HOMEM ENCAPUZADO, VESTIDO COM A ROUPA DO SUPER HOMEM. O HOMEM ESTÁ NERVOSO, ELE SEGURA UMA ARMA. AO SEU LADO, UM SACO COM OBJETOS ROUBADOS. O HOMEM ESTÁ DE TOCAIA, OLHANDO PELA JANELA, TENTANDO VER OQUE ESTÁ ACONTECENDO NA RUA.

PAULINHO – (LEVA UM SUSTO) Super homem?!

SUPER HOMEM - Shuuu! Cala a boca!

PAULINHO - Não acredito! O que você está fazendo aqui? Caraca, o Super Homem no meu quarto!

SUPER HOMEM - Se você der um pio, eu acabo contigo.

PAULINHO - Comigo? O que foi que eu fiz?

SUPER HOMEM – Nasceu!

PAULINHO - Ah, já sei! Já sei o que você tá fazendo aqui. Você veio prender os bandidos! Uhuu! (PAULINHO PROCURA ENTRE SEUS BRINQUEDOS UMA ARMA)

SUPER HOMEM – O que você está fazendo? O que é isso?

PAULINHO – Tô procurando a minha arma. O meu revólver. Eu vou te ajudar a prender os ladrões.

SUPER HOMEM FICA NERVOSO E APONTA A ARMA DE VERDADE PRA ELE.

SUPER HOMEM – Larga isso! Quer dar uma de engraçadinho comigo, é? Se você fizer alguma coisa eu atiro, pivete.

PAULINHO – Calma, Super Homem eu só quero ajudar. Nós estamos do mesmo lado. Do lado dos fracos e oprimidos!

SUPER HOMEM – Me passa essa arma. Já disse, a arma! (SUPER HOMEM PEGA E VÊ QUE É UMA ARMA DE BRINQUEDO JOGA EM CIMA DA CAMA).

PAULINHO – Foi meu pai que me deu.

SUPER HOMEM - Cala a boca! Tem bebida aqui?

PAULINHO - Serve o toddynho da minha merenda?

SUPER HOMEM VAI ATÉ A JANELA PRA TENTAR VER ALGUMA COISA.

SUPER HOMEM – Droga, eu tenho que arrumar um jeito de sair. Você viu se a policia ainda tá rondando?

PAULINHO – Não vi, não. Mas se você quiser eu chamo a polícia. Quer?

SUPER HOMEM – Não! Tá maluco?

PAULINHO – Bem que eu estava achando estranho. O Super Homem nunca precisou da ajuda dos tiras. Você resolve tudo sozinho, não é Super?

SUPER HOMEM – É... é isso mesmo.

SUPER HOMEM OLHA PELA JANELA NOVAMENTE. O GAROTO SE APROXIMA DO SACO. DE ONDE TIRA CELULAR, MÁQUINA FOTOGRÁFICA.

PAULINHO - Que saco é esse? Você trouxe presente pra mim?

SUPER HOMEM - Caralho! Não mexe nisso!

PAULINHO - Você fala palavrão, Super homem? Minha mãe diz que é feio falar palavrão.

SUPER HOMEM - Tira a mão daí! Tu quer morrer?

PAULINHO - Ninguém morre ao lado do Super homem!

SUPER HOMEM – Que mala...

PAULINHO - Você acha que nós estamos correndo perigo de vida?

SUPER HOMEM - Você está.

PAULINHO - Eu? (T) Manhê!

SUPER HOMEM - Shuuuu! Porra, moleque!

A MÃE GRITA DA SALA

MÃE - Que foi, Paulinho?

PAULINHO - O Super Homem tá falando palavrão.

SUPER HOMEM – Shuuuu!

MÃE - Paulinho, me dá uma folga, tá bom? Seu pai me estressou de um modo que eu estou toda tremendo por dentro.

SUPER – Agora você vai ficar de bico calado. Estamos entendidos?

PAULINHO - Vem cá. Vou te mostrar uma coisa. Promete que não conta pra ninguém?

PAULINHO MOSTRA GARRAFAS DE CACHAÇA ESCONDIDAS DEBAIXO DA CAMA OU NUMA CAIXA.

SUPER HOMEM - Porra, tava escondendo o jogo, garoto?

PAULINHO – É tudo do meu pai. Ele me pediu pra guardar segredo. Mas pra você eu posso contar, né? Afinal, você é o Super Homem.

SUPER HOMEM ABRE A GARRAFA E BEBE A CACHAÇA.

PAULINHO - Você bebe que nem o meu pai.

SUPER HOMEM - Teu pai deve ser gente boa.

PAULINHO - Minha mãe não acha!

SUPER HOMEM – Liga não, mulher é tudo igual.

BARULHO DE SIRENE.

SUPER HOMEM – Merda! Vem cá, garoto.

PAULINHO - O que você vai fazer?

SUPER HOMEM – Nós... nós vamos dar uma volta.

PAULINHO – Volta? Nós dois? Que maneiro! Eu vou voar? Caramba! Eu vou voar com o Super homem. Nós vamos prender os bandidos? Quando eu contar ninguém vai acreditar. Cadê a sua máquina?

SUPER HOMEM - Que máquina?

PAULINHO – A máquina de tirar foto que tá dentro do saco. Eu quero uma foto com você. Eu e o Super Homem.

SIRENE DE POLÍCIA SE APROXIMA. SUPER HOMEM SE AGITA.

SUPER HOMEM – Foto a gente deixa pra depois, mas voar... Voar eu prometo que você vai.

PAULINHO – Que maneiro...

SUPER HOMEM PEGA O GAROTO, COLOCA A ARMA NA CABEÇA DELE E SAI GRITANDO.

SUPER HOMEM - Se fizerem alguma coisa eu atiro no moleque! Não tô de brincadeira, não! Mando ele pro espaço! Tão me entendendo? Pro espaço!

SUPER HOMEM – (BAIXINHO P/ PAULINHO) Eu não disse, que a gente ia voar, garoto?

PAULINHO – Super Homem, quando eu crescer quero ser igual a você.

FIM.

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MÚSICA: Gita (Raul Seixas)

A REVELAÇÃO (Carla Faour)

CENA 01 – PRAÇA. EXT.DIA

CRIS ESTÁ NUMA PRAÇA. ELA AGE COMO SE ESTIVESSE PREGANDO OU FAZENDO UM COMÍCIO. RODOLFO APARECE E TENTA TIRÁ-LA DE LÁ, À FORÇA.

CRIS – Por que você me pergunta.
Perguntas não vão lhe mostrar
Que eu sou feito da terra
Do fogo, da água e do ar.

RODOLFO - Vamos embora!

CRIS – Me larga!

RODOLFO - Você vem comigo!

CRIS – Me solta! Olha o vexame na frente dos meus seguidores.

RODOLFO - Seguidores? Por acaso, você tá no twitter?

CRIS – Quantas vezes eu vou ter que repetir. Eu tive uma revelação.

RODOLFO - Uma revelação na sua despedida de solteira?

CRIS - Qual o problema?

RODOLFO - No Clube das Mulheres?

CRIS – Você não acredita, não é?

RODOLFO - O que foi que você tomou nesse Clube, “chá de cueca”?

CRIS – Como você é grosso! Mas eu te perdôo.

RODOLFO - Eu também te perdôo, Cris. É o stress pré nupcial, eu entendo. Nosso casamento chegando...

CRIS - Rodolfo, eu já te disse. Não vai mais haver casamento. Minha vida tomou outro rumo.

RODOLFO - Você vai tomar é o rumo de casa.

CRIS - Um rumo espiritual!

RODOLFO – Não se preocupe que eu já peguei a indicação do médico que faz a reposição hormonal. Tia Nancy disse que ele é ótimo.

CRIS – Você acha que eu estou doente?

RODOLFO - Surtada. Acontece, uma vez por mês, já me acostumei.

CRIS – “Eu sou a luz das estrelas,

Eu sou a cor do luar
Eu sou as coisas da vida
Eu sou o medo de amar”.

RODOLFO – Ok. E eu sou o Raul Seixas.

CRIS - Você acha que eu estou brincando, não é Rodolfo?

RODOLFO - O que você quer? Que eu acredite nesse delírio megalomaníaco?

CRIS – Nossa, como você é difícil!

RODOLFO – Eu? “Você diz que teve uma revelação no Clube de Mulheres, na sua despedida de solteira, lá um anjo apareceu e anunciou que você era “Deus”, e eu que sou difícil?!!!

CRIS – Eu não disse isso!

RODOLFO - Ah, que alívio.

CRIS – Eu NÃO disse que foi um anjo. Eu disse que foi a Lúcia.

RODOLFO - Que Lucia?

CRIS - Irmã Lucia.

RODOLFO - Quem?

CRIS - Eu sou o terceiro segredo. De Fátima.

RODOLFO - Você é o quê?

CRIS - Shuuu, é segredo!

RODOLFO - Ok, Cris. Vamos fazer o seguinte? Eu não conto pra ninguém. Isso fica entre a gente. Mas vamos sair daqui, por favor?

CRIS – Não posso. Meu lugar é junto ao meu povo.

RODOLFO TENTA SE SEGURAR MAS ACABA RINDO.

CRIS – Tá rindo de quê? Só pra você saber: Desde o século II já tinham previsto que a próxima encarnação do divino espírito santo seria uma entidade feminina.

RODOLFO - Quem previu esta barbaridade?

CRIS - O que eu tenho que fazer pra você acreditar em mim?!

RODOLFO – Pra acreditar que você é DEUS? Só um milagre!

CRIS – Que piadinha infame.

RODOLFO - Um milagrinho só, Deus,vai! Ou Deusa?

CRIS – Hã?

RODOLFO - Como que eu devo te chamar? Deus ou Deusa?

CRIS - Como? Sabe que eu não sei? Ainda não recebi instruções.

ROODLFO - Instruções de quem, cara pálida? Se você é Deus, quem é teu chefe?

CRIS – Rodolfo!

RODOLFO - Deus mulher?!!! Caramba, vocês piram mesmo.

CRIS – Ai! Sabia que você ia tocar nesse ponto! Estava só esperando! Nós já conquistamos tantas coisas, meu bem. Nós somos a maioria da população mundial, a maioria no concurso do ENEM, a maioria nas aulas de dança de salão do Jaime Aroucha. Já somos até Presidente da República. Chegar a Deus é um caminho natural. Não acha?

RODOLFO – Claro. Era o que estava faltando no currículo de vocês.

CRIS - Vem cá, eu senti uma ponta de deboche na sua entonação de voz?

RODOLFO – Eu?

CRIS - Sarcasmo?

RODOLFO - Imagina.

CRIS - Despeito.

RODOLFO - Longe de mim. Eu só acho que.

CRIS - Que?

RODOLFO - é...

CRIS - Completa a frase, Rodolfo.

RODOLFO – Eu só acho que é...

CRIS - Desenvolve.

RODOLFO - Eu só acho que é muita...

CRIS – Dá continuidade, Rodolfo!

RODOLFO – Se você me deixar falar! Eu só acho que é muita responsabilidade!

CRIS – Ah, quer dizer que pra você eu não estou preparada para a missão?!!!.

RODOLFO - Eu não disse isso!

CRIS – Não disse, mas ia dizer. Eu sei muito bem aonde você quer chegar.

RODOLFO – Qual, é, Cris? Só porque é Deus acha que pode ler pensamentos?

CRIS – Você nem imagina do que eu sou capaz.

RODOLFO – Ai que medo!

CRIS - Se eu fosse você tomava cuidado mesmo.

RODOLFO – Tá me ameaçando?

CRIS - Só te dando um toque.

RODOLFO – Quem você pensa que é?

CRIS – Você sabe com quem está falando?

RODOLFO – Você tá se sentindo, né? Quer conhecer uma pessoa, dê poder a ela!

CRIS – Você não vai gostar de ver Deus irritado!

RODOLFO – O mundo tá perdido.

CRIS – Hã? Eu não ouvi direito. Dá pra repetir?

RODOLFO – Eu disse que “Deus” devia escutar melhor.

CRIS - Você está querendo insinuar que eu não tenho competência para o cargo, Rodolfo?!!!!

RODOLFO – Ai meu cacete! Tô perdendo a paciência.

CRIS – Como? Eu ouvi bem o que você falou?

RODOLFO – Ouviu. Eu falei: “Ai meu cacete”!

CRIS TIRA UM BLOQUINHO E UMA CANETA DA BOLSA OU DE UM BOLSO NA ROUPA E ANOTA ALGUMA COISA. RODOLFO ESPIXA O OLHO.

RODOLFO – O que você está fazendo?

CRIS – Anotando, ué!

RODOLFO – Isso eu estou vendo. Mas anotando o quê?

CRIS – Estou debitando da sua conta.

RODOLFO – Conta? Que conta?

CRIS – Um novo método que eu vou implantar: Cada ser humano terá uma conta pessoal e intransferível. À medida que for cometendo pecados, Deus vai subtraindo a pontuação dos seus créditos. Cada pecado cometido corresponde a um número de pontos perdidos, de acordo com a tabela divina. Depois de somar todos os pecados, subtrair dos seus créditos, chega-se à sua média final que, dependendo do número, te dá condições de você ir, ou não, pra lá. (CRIS APONTA PARA O ALTO).

RODOLFO – Como é que é?

CRIS – Nunca ouviu falar no juízo final, Rodolfo?!!!

RODOLFO – Quer dizer que pra ir pro CEU eu vou ter que ter carteira de habilitação?

CRIS – Uma espécie de.

RODOLFO – Só falta a Lei seca.

CRIS – Está em estudos.

RODOLFO – Que absurdo! Você enlouqueceu mesmo!

CRIS - Eu enlouqueci? Vocês vão me agradecer. Eu vou botar ordem nessa bagunça. Nessa pouca vergonha, nessa bandalheira. As coisas vão mudar.

RODOLFO – Por acaso, você está criticando a administração anterior?

CRIS – Não adianta fazer futrica e tentar me colocar contra o meu filho.

RODOLFO – Você tem filho?

CRIS - Não se faça de besta, Rodolfo!

RODOLFO – Juro que não sabia.

CRIS – Já ouvi falar num tal de “Jesus”?! Pois é.

RODOLFO – Tô começando a ficar preocupado. Essa história já foi longe demais.

CRIS – (sentida) Também acho. Eu esperava outra coisa de você.

RODOLO – O quê por exemplo?

CRIS – Apoio, compreensão, FÉ...

RODOLFO – Qual o teu plano de saúde, mesmo?

CRIS – Eu só te digo uma coisa: Quem está torcendo contra, fazendo “vudu” e duvidando da minha capacidade, COMO CERTAS PESSOAS QUE EU CONHEÇO, vai se dar mal.

RODOLFO – Cobertura total? Quarto particular ou enfermaria? Tem Copa Do’r?

CRIS – Eu te odeio!

RODOLFO – Olha que Deus castiga!

CRIS – Palhaço!

RODOLFO - Você é muito infantil.

CRIS – Além de tudo eu sou infantil?

RODOLFO – Você não é infantil. Você é MUITO infantil.

CRIS – Rodolfo!

CRIS COMEÇA A CHORAR.

RODOLFO – Ai meu Deus!

CRIS – Me chamou?

RODOLFO – Esse chá de cueca dá onda mesmo.

CRIS - Pensa que é fácil pra mim? Não é não! Muita pressão. Eu fui pega desprevinida. Eu nem desconfiava. Que eu sou eu. Quer dizer, ELE. Sabe, é um momento difícil. De adaptação. Eu achei que você ia me apoiar.

RODOLFO - Cris, cris, olha pra mim. Não chora, não chora, Cris. Não faz assim. Cris, se controla. Não perde o controle. Engole o choro. Engole o choro. Assim. Isso. Respira fundo. (T) Eu não sei o que aconteceu na sua despedida de solteira, nem quero saber, mas pra mim chega! Acabou a brincadeira.

CRIS – Então empatamos. Pra mim também chega!

RODOLFO – Ótimo, concordamos em pelo menos alguma coisa.

CRIS – Acho que você não vai concordar é com o que eu vou fazer.

RODOLFO – O quê?

CRIS – Que fique bem claro que foi você que me obrigou.

RODOLFO – Do que você está falando?

CRIS – Eu não queria usar os meus poderes. Mas você não me deixou outra alternativa. “Homem sem fé”...

RODOLFO – Ah, deixa de ser ridícula! Será que eu vou ter que te levar à força pra casa?

CRIS – Me larga, Rodolfo! Me larga. (CRIS USA SEUS PODERES) PLIM! Estátua!

RODOLFO REALMENTE FICA PARALISADO. CRIS OLHA E COMEÇA A CANTAR.

CRIS – “Eu sou o seu sacrifício
A placa de contra-mão
O sangue no olhar do vampiro
E as juras de maldição

Eu sou a vela que acende
Eu sou a luz que se apaga
Eu sou a beira do abismo
Eu sou o tudo e o nada.

FIM.

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