MÚSICA: DOCE VAMPIRO
CENA: VAMPIRO MUTANTE.
PERSONAGENS: JÔ, MEG E DIMITRI.
CENA 1 - SPA. HALL DE ENTRADA. DUAS AMIGAS SE ENCONTRAM.
MEG - Jô!
JÔ - Meg!
MEG - Tenho te ligado tanto. Você não me retorna.
JÔ - Desculpa. Namorado novo.
MEG - Sabia. Tá perdoada.
JÔ - Ele tem uns horários diferentes. Ando trocando o dia pela noite.
MEG - Insônia?
JÔ - Malhação.
MEG MALICIOSA.
MEG - Malhação de “malhação”?
JÔ - Malhação de academia, Magali.
MEG - Ah. Você está ótima mesmo. Magérrima.
JÔ - Tô feliz, só isso.
MEG - Pele boa.
JÔ - A gente tem que se cuidar.
JÔ MEXE NO CABELO DEIXANDO O PESCOÇO À MOSTRA.
MEG - Ih, menina, o mosquito te mordeu no pescoço.
JÔ - Esses dois furinhos um do lado do outro?
MEG - Cuidado com a dengue.
JÔ SORRI.
JÔ - Não foi mosquito, não. Foi ele.
MEG - Ele... O?
JÔ - O próprio.
MEG - Nossa, que animado.
JÔ - Uma loucura.
MEG - Mas ele exagerou no chupão. Te deixou toda marcada.
JÔ - O amor verdadeiro deixa marcas.
MEG – Hum. Me conta. Como é esse príncipe encantado?
JÔ - Nem sei explicar. Ele é... diferente. De todos os caras que eu já fiquei.
MEG - Parabéns.
JÔ - Só tem uma coisinha.
MEG – Ah. Eles têm sempre uma coisinha.
JÔ - Nada demais. Só um detalhe.
MEG - Casado?
JÔ - Não!
MEG - Mau hálito?
JÔ - Não!
MEG - É velho?
JÔ - Um pouco.
MEG - Quantos anos?
JÔ - Muitos.
MEG - Muitos tipo meu pai?
JÔ - Muitos tipo seu tataravô.
MEG - Cruz credo!
JÔ - Mas ele aparenta muito menos.
MEG - Menos quanto?Menos tipo seu bisavô?
JÔ - Menos tipo você.
MEG - Eu? Mas como pode? Quantos anos ele tem, afinal?
JÔ - Sabe que eu não sei? Ele esconde a idade.
MEG - Vaidoso, é?
JÔ - Ele é um vampiro, Meg.
MEG - Ele é o quê?!!
JÔ - Vampiro.
MEG - Você está de gozação com a minha cara!
JÔ - Nunca falei tão sério.
MEG - Tudo bem que as coisas estão difíceis, a oferta é escassa, a demanda altíssima. Mas convenhamos.
JÔ - Ele é incrível! Me faz tão feliz.
MEG - Ele é violento. Fica te mordendo.
JÔ - É carinho, Meg.
MEG - Você não toma jeito. Sempre teve uma queda por caras estranhos. Pelas minorias. Lembra aquela vez que você namorou um esquimó?
JÔ - Foi a maior fria.
MEG - Mas agora você se superou.
JÔ - Com ele não é só pele, Meg. Nós temos muito em comum, gostamos das mesmas coisas, compartilhamos os mesmos valores.
MEG - Você e o Vampiro?
JÔ - Dimitri. O nome dele é Dimitri.
MEG - Gringo, é?
JÔ - Romeno.
MEG - Romeno?!!
JÔ - O que você queria? Um vampiro africano?
MEG - E como vocês se entendem?
JÔ - Na língua universal, ué: mímica. Eu também arranho um pouco de inglês. Ele de espanhol. Conchita, a babá dele lá na Transilvânia, era paraguaia.
MEG - Transilvânia? Babá paraguaia? Só falta você me dizer que ele mora num Castelo?
JÔ - Como você adivinhou?
MEG - Jô, cai fora! Esse cara não é pra você.
JÔ - Você está sendo intolerante, Meg. O Dimitri só é... diferente.
MEG - Claro que é diferente. É um vampiro, porra!
JÔ - Ser vampiro é apenas um detalhe.
MEG - Olha como você está magra, ele está te vampirizando!
JÔ - Eu estou magra porque estou malhando! Aliás, nós dois.
MEG - Você e o conde drácula?
JÔ - Sem piadinhas. Dimitri é super saudável.
MEG - Saudável? Ele é um bebedor de sangue!
JÔ - Dietético.
MEG - Hã?
JÔ - O Dimitri não bebe sangue doce. Por isso eu aboli o açúcar.
MEG - Vampiro diabético. Essa é boa.
JÔ - Ele não é diabético. É dietético. Ele está de dieta.
MAGALI DEBOCHADA.
MEG - Qual? Do grupo sanguíneo? Desculpa, não resisti.
JÔ - Mas é isso mesmo. Dieta do grupo sanguíneo. E eu sou o tipo dele: A+.
MEG - Quer dizer que esse vampiro veio para o Brasil pra emagrecer e fazer turismo sexual?
JÔ - Agora você me ofendeu! O Dimitri é um cara sério. Ele veio ao Brasil pra fazer tratamento! Tá satisfeita?
MEG - Sabia que você estava me escondendo alguma coisa! O morcegão tá doente?
JÔ - Quem?!
MEG - Essa coisa de sangue é coisa séria, Jô. Olha que tem um surto de Hepatite B por aí. Você está se protegendo?
JÔ - Tratamento estético.
MEG - Do que você está falando?
JÔ - Foi isso que ele veio fazer no Brasil. Tratamento estético. Nós nos conhecemos aqui.
MEG - No SPA “Beleza integral”?
JÔ - Mais precisamente fazendo bronzeamento artificial. Ele adora. Diz que a câmera de bronzeamento lembra o caixãozinho dele da infância, lá na Transilvânia. Claro que mais quentinho. Ele diz que só falta a Conchita cantando “Guantanamera” pra ele. Não é uma graça?
MEG - É, realmente o Dimitri é...
JÔ - Diferente. Diferente e atrasado.
MEG - Ele tá vindo pra cá?
JÔ - Já devia ter chegado.
MEG – Até que enfim vou conhecer o dito cujo.
JÔ - Atrasadíssimo.
MEG - Homem que é homem não deixa mulher esperando.
JÔ - Pois eu esperaria por ele a minha vida inteira.
MEG - Só uma curiosidade. Ele vem voando?
JÔ - Você acha que é assim? Que ele sai voando toda hora? Não, só em ocasiões especiais. O vento resseca o cabelo.
MEG - Quer dizer que além de fazer dieta, malhar e fazer bronzeamento artificial, ele ainda cuida dos cabelos?
JÔ - Descobriu a manteiga de carité. Comprou centenas de potes pra levar pra Transilvânia.
MEG - Não diga? Contrabando é crime, sabia?
JÔ - Que horas são?
MEG - Duas.
JÔ - Já? Nós marcamos de fazer a sobrancelha...
MEG - Nós?
JÔ - Depois da depilação... Será que vai dar tempo?
MEG - Ele é daqueles que se depilam?
JÔ - Todinho.
MEG - Jô, será que você não percebe?
JÔ - Já sei. Você deve estar achando estranho, não é?
MEG – Imagina!
JÔ - Eu também demorei a me acostumar. Mas eu te digo que é normal. Hoje em dia eles são assim. Sofreram uma mutação.
MEG - Eu sou antiquada. Prefiro as coisas à moda antiga.
JÔ - Até concordo que antigamente eles eram mais charmosos, mais...
MEG - Viris...
Jô - Por outro lado, hoje em dia eu posso dividir com ele momentos como esse.
Meg - Como da depilação, por exemplo?
Jô - Momentos à luz do dia.
MEG - Você só me confunde!
JÔ - Essa nova geração que sofreu a mutação não tem problema com a luz do sol. Eles podem sair de dia, não precisam dormir de cabeça pra baixo e não tem problema nenhum com alho. São mais desencanados.
MEG - Quer dizer que o molho pesto tá liberado?
JÔ - Não é incrível? Ai, aí vem ele.
DIMITRI CHEGA. ELE ESTÁ BEM ARRUMADO E MAQUIADO.
DIMITRI - Jô, minha querrrida.
JÔ - Amor, você demorou. Quase morro de saudade.
JÔ ABRAÇA DIMITRI E, SEM QUERER, MEXE NO CABELO DELE. DIMITRI SE AJEITA.
JÔ - Amor, quero te apresentar uma amiga. My friend, Magali.
DIMITRI - Hello. Muita prrrrazer. Encanado.
JÔ - “Encantado”.
DIMITRI - What?
JÔ – “Encantado”, amor. É palavra certa.
DIMITRI - Perdon pelo português.
JÔ - All right. Tudo bien.
DIMITRI - E pelo atrrrraso. É que eu ficar na dúvida sobre qual roupa vestir. Eu experimentar quase todo o armário. O que você achar? Estou bien?
JÔ - “Mui guapo”. Tu non achas, Magali?
MEG - Hã?
JÔ - Ele quer saber se a roupa está boa.
MEG - La calcita está um pouco apertadita...
JÔ - Tá lindo, amor! A Magali acha que la calcita valoriza o bum bum.
DIMITRI - Perdon? Non compreendo.
JÔ - Valoriza. Lo bundon.
MEG E JÔ FAZEM MÍMICA
DIMITRI - Oh, si! Yes. Yes! Gracias! (T) Ohhh!
MEG - Ai, o que foi?
JÔ - Ele está olhando pra suas mãos.
MEG - Por quê?
JÔ - Ele é louco por mãos.
MEG – Jô, se ele chupar minhas mãos você me paga!
DIMITRI - Yo estoi mirando tuas. How can I say, this?
JÔ - Unhas.
DIMITRI – Unhas? Yo estoi mirando sus unhas. Magníficas! What color?
JÔ - Ele quer saber a cor do seu esmalte.
MEG - Eu preciso te dizer uma coisa, Jô. Esse vampiro é morcega.
JÔ - O Dimitri? Imagina!
MEG – Essas coisas todas de bronzeamento, depilação, sobrancelha. Isso não é coisa de homem!
JÔ - Claro que não! Isso é coisa de vampiro. Vampiro mutante. Coisa de homem é o que ele vai fazer agora.
DIMITRI VEM POR TRÁS E MORDE O PESCOÇO DE MEG.
DIMITRI - Hum. Doce!
JÔ - Você não estava de dieta, mi coraçon?
DIMTRI - Sorry, não resisti.
JÔ – Não te disse, Meg, que ele era...
MEG – Homem!
JÔ – Ser vampiro ou homem é apenas um detalhe. O que importa é que ele é... Diferente.
JÔ E DIMITRI SE BEIJAM. ENTRA A MÚSICA.
FIM.
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MÚSICA: IDEOLOGIA - carla faour
CENA: AQUELE GAROTO QUE IA MUDAR O MUNDO.
CENA 1 – SALA DA CASA. INT. DIA
MENINO BRINCA ENQUANTO A MÃE FALA AO TELEFONE.
PAULINHO - O Super Homem vai acabar com os bandidos! Pow! Pow! Pow!
MÃE - Estou tremendo até agora, Ricardo. Precisa ver a confusão que tá aqui na rua. Polícia, sirene... tão dizendo que ele estava encapuzado. Coisa de profissional, mesmo.
PAULINHO - Eu tenho super poderes!
MÃE - O Paulinho tá bem. Agitado, mas bem.
PAULINHO - Não tenho super poderes, mãe? Mãe! Manhê!
MÃE - Nessas horas é importante a figura do pai, pra dar segurança. Que horas você vai passar pra pegar ele?
PAULINHO - Manhê, eu tenho super poderes?
MÃE - Tem, Paulinho. Tem sim.
PAULINHO - Oba! Eu tenho super poderes!
MÃE - Não vem? Como assim, Ricardo? De novo? Não acredito!
PAULINHO - Super visão de raio x! Super força! Vou matar todos os meus inimigos! Arrancar a cabeça de todos eles! Estourar os miolos!
PAULINHO SOBE NOS MÓVEIS FAZENDO BARULHO DE TIRO.
PAULINHO – POW! POW!
MÃE - Desce daí! Não, Ricardo, estou falando com seu filho. Vem cá, onde você tá, hem? Que barulheira é essa? Ocupado? Sei! Sei muito bem qual é a sua ocupação. (p/ Paulinho) Já disse pra você descer! Você vai se machucar, menino! Eu não acredito que, justo hoje, você não vem buscar ele! É o fim da picada!
PAULINHO - Mãe, se eu me machucar o Super Homem vem me salvar?
MÃE - Se você se machucar a sua “super mãe” vai te levar pro hospital. Porque o seu pai... Ué, qual o problema? Eu estou mentindo, Ricardo? Ele só tem a mãe mesmo, por que o pai... Sabe há quanto tempo você não vê o Paulinho?
PAULINHO - Quem é mais forte, mãe? Meu pai ou o Super Homem?
MÃE - Com certeza o Super Homem. (p/ Ricardo) É por isso que ele está com problemas na escola. É a falta da figura paterna. Eu o quê? Estou colocando o seu filho contra você? Ah, me poupe! Ricardo, eu não quero discutir isso na frente do. Paulinho, vai pro seu quarto, vai meu filho.
PAULINHO - Mas por quê?
MÃE - Por que eu quero!
PAULINHO - Mas eu...
MÃE – Eu estou mandando. Vai estudar. Já fez o seu dever de casa? Vai fazer o dever de casa. (P/ Paulinho)
PAULINHO – Pôxa, mãe.
MÃE - Agora! (p/ Ricardo)
PAULINHO - Aposto que o Super Homem nunca estudou.
MÃE - Aposto que você não vem pegar seu filho porque tá aí na farra, não é Ricardo? Na galinhagem...
MÃE CONTINUA CONVERSANDO COM PAI AO TELEFONE. PAULINHO VAI PARA O QUARTO FALANDO.
PAULINHO - Vou matar todos os impostores! Todos! Um por um! Tchum! Tchum! Vou arrancar os olhos deles. De todos os ladrões e malfeitores!
MÃE - Você pensa que ele não percebe o que tá acontecendo. Como “o quê”? Tudo! Ele sabe que você não dá menor bola pra ele...
CENA 2 – QUARTO DE PAULINHO. INT. DIA.
PAULINHO ENTRA NO QUARTO E DÁ DE CARA COM UM HOMEM ENCAPUZADO, VESTIDO COM A ROUPA DO SUPER HOMEM. O HOMEM ESTÁ NERVOSO, ELE SEGURA UMA ARMA. AO SEU LADO, UM SACO COM OBJETOS ROUBADOS. O HOMEM ESTÁ DE TOCAIA, OLHANDO PELA JANELA, TENTANDO VER OQUE ESTÁ ACONTECENDO NA RUA.
PAULINHO – (LEVA UM SUSTO) Super homem?!
SUPER HOMEM - Shuuu! Cala a boca!
PAULINHO - Não acredito! O que você está fazendo aqui? Caraca, o Super Homem no meu quarto!
SUPER HOMEM - Se você der um pio, eu acabo contigo.
PAULINHO - Comigo? O que foi que eu fiz?
SUPER HOMEM – Nasceu!
PAULINHO - Ah, já sei! Já sei o que você tá fazendo aqui. Você veio prender os bandidos! Uhuu! (PAULINHO PROCURA ENTRE SEUS BRINQUEDOS UMA ARMA)
SUPER HOMEM – O que você está fazendo? O que é isso?
PAULINHO – Tô procurando a minha arma. O meu revólver. Eu vou te ajudar a prender os ladrões.
SUPER HOMEM FICA NERVOSO E APONTA A ARMA DE VERDADE PRA ELE.
SUPER HOMEM – Larga isso! Quer dar uma de engraçadinho comigo, é? Se você fizer alguma coisa eu atiro, pivete.
PAULINHO – Calma, Super Homem eu só quero ajudar. Nós estamos do mesmo lado. Do lado dos fracos e oprimidos!
SUPER HOMEM – Me passa essa arma. Já disse, a arma! (SUPER HOMEM PEGA E VÊ QUE É UMA ARMA DE BRINQUEDO JOGA EM CIMA DA CAMA).
PAULINHO – Foi meu pai que me deu.
SUPER HOMEM - Cala a boca! Tem bebida aqui?
PAULINHO - Serve o toddynho da minha merenda?
SUPER HOMEM VAI ATÉ A JANELA PRA TENTAR VER ALGUMA COISA.
SUPER HOMEM – Droga, eu tenho que arrumar um jeito de sair. Você viu se a policia ainda tá rondando?
PAULINHO – Não vi, não. Mas se você quiser eu chamo a polícia. Quer?
SUPER HOMEM – Não! Tá maluco?
PAULINHO – Bem que eu estava achando estranho. O Super Homem nunca precisou da ajuda dos tiras. Você resolve tudo sozinho, não é Super?
SUPER HOMEM – É... é isso mesmo.
SUPER HOMEM OLHA PELA JANELA NOVAMENTE. O GAROTO SE APROXIMA DO SACO. DE ONDE TIRA CELULAR, MÁQUINA FOTOGRÁFICA.
PAULINHO - Que saco é esse? Você trouxe presente pra mim?
SUPER HOMEM - Caralho! Não mexe nisso!
PAULINHO - Você fala palavrão, Super homem? Minha mãe diz que é feio falar palavrão.
SUPER HOMEM - Tira a mão daí! Tu quer morrer?
PAULINHO - Ninguém morre ao lado do Super homem!
SUPER HOMEM – Que mala...
PAULINHO - Você acha que nós estamos correndo perigo de vida?
SUPER HOMEM - Você está.
PAULINHO - Eu? (T) Manhê!
SUPER HOMEM - Shuuuu! Porra, moleque!
A MÃE GRITA DA SALA
MÃE - Que foi, Paulinho?
PAULINHO - O Super Homem tá falando palavrão.
SUPER HOMEM – Shuuuu!
MÃE - Paulinho, me dá uma folga, tá bom? Seu pai me estressou de um modo que eu estou toda tremendo por dentro.
SUPER – Agora você vai ficar de bico calado. Estamos entendidos?
PAULINHO - Vem cá. Vou te mostrar uma coisa. Promete que não conta pra ninguém?
PAULINHO MOSTRA GARRAFAS DE CACHAÇA ESCONDIDAS DEBAIXO DA CAMA OU NUMA CAIXA.
SUPER HOMEM - Porra, tava escondendo o jogo, garoto?
PAULINHO – É tudo do meu pai. Ele me pediu pra guardar segredo. Mas pra você eu posso contar, né? Afinal, você é o Super Homem.
SUPER HOMEM ABRE A GARRAFA E BEBE A CACHAÇA.
PAULINHO - Você bebe que nem o meu pai.
SUPER HOMEM - Teu pai deve ser gente boa.
PAULINHO - Minha mãe não acha!
SUPER HOMEM – Liga não, mulher é tudo igual.
BARULHO DE SIRENE.
SUPER HOMEM – Merda! Vem cá, garoto.
PAULINHO - O que você vai fazer?
SUPER HOMEM – Nós... nós vamos dar uma volta.
PAULINHO – Volta? Nós dois? Que maneiro! Eu vou voar? Caramba! Eu vou voar com o Super homem. Nós vamos prender os bandidos? Quando eu contar ninguém vai acreditar. Cadê a sua máquina?
SUPER HOMEM - Que máquina?
PAULINHO – A máquina de tirar foto que tá dentro do saco. Eu quero uma foto com você. Eu e o Super Homem.
SIRENE DE POLÍCIA SE APROXIMA. SUPER HOMEM SE AGITA.
SUPER HOMEM – Foto a gente deixa pra depois, mas voar... Voar eu prometo que você vai.
PAULINHO – Que maneiro...
SUPER HOMEM PEGA O GAROTO, COLOCA A ARMA NA CABEÇA DELE E SAI GRITANDO.
SUPER HOMEM - Se fizerem alguma coisa eu atiro no moleque! Não tô de brincadeira, não! Mando ele pro espaço! Tão me entendendo? Pro espaço!
SUPER HOMEM – (BAIXINHO P/ PAULINHO) Eu não disse, que a gente ia voar, garoto?
PAULINHO – Super Homem, quando eu crescer quero ser igual a você.
FIM.
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MÚSICA: Gita (Raul Seixas)
A REVELAÇÃO (Carla Faour)
CENA 01 – PRAÇA. EXT.DIA
CRIS ESTÁ NUMA PRAÇA. ELA AGE COMO SE ESTIVESSE PREGANDO OU FAZENDO UM COMÍCIO. RODOLFO APARECE E TENTA TIRÁ-LA DE LÁ, À FORÇA.
CRIS – Por que você me pergunta.
Perguntas não vão lhe mostrar
Que eu sou feito da terra
Do fogo, da água e do ar.
RODOLFO - Vamos embora!
CRIS – Me larga!
RODOLFO - Você vem comigo!
CRIS – Me solta! Olha o vexame na frente dos meus seguidores.
RODOLFO - Seguidores? Por acaso, você tá no twitter?
CRIS – Quantas vezes eu vou ter que repetir. Eu tive uma revelação.
RODOLFO - Uma revelação na sua despedida de solteira?
CRIS - Qual o problema?
RODOLFO - No Clube das Mulheres?
CRIS – Você não acredita, não é?
RODOLFO - O que foi que você tomou nesse Clube, “chá de cueca”?
CRIS – Como você é grosso! Mas eu te perdôo.
RODOLFO - Eu também te perdôo, Cris. É o stress pré nupcial, eu entendo. Nosso casamento chegando...
CRIS - Rodolfo, eu já te disse. Não vai mais haver casamento. Minha vida tomou outro rumo.
RODOLFO - Você vai tomar é o rumo de casa.
CRIS - Um rumo espiritual!
RODOLFO – Não se preocupe que eu já peguei a indicação do médico que faz a reposição hormonal. Tia Nancy disse que ele é ótimo.
CRIS – Você acha que eu estou doente?
RODOLFO - Surtada. Acontece, uma vez por mês, já me acostumei.
CRIS – “Eu sou a luz das estrelas,
Eu sou a cor do luar
Eu sou as coisas da vida
Eu sou o medo de amar”.
RODOLFO – Ok. E eu sou o Raul Seixas.
CRIS - Você acha que eu estou brincando, não é Rodolfo?
RODOLFO - O que você quer? Que eu acredite nesse delírio megalomaníaco?
CRIS – Nossa, como você é difícil!
RODOLFO – Eu? “Você diz que teve uma revelação no Clube de Mulheres, na sua despedida de solteira, lá um anjo apareceu e anunciou que você era “Deus”, e eu que sou difícil?!!!
CRIS – Eu não disse isso!
RODOLFO - Ah, que alívio.
CRIS – Eu NÃO disse que foi um anjo. Eu disse que foi a Lúcia.
RODOLFO - Que Lucia?
CRIS - Irmã Lucia.
RODOLFO - Quem?
CRIS - Eu sou o terceiro segredo. De Fátima.
RODOLFO - Você é o quê?
CRIS - Shuuu, é segredo!
RODOLFO - Ok, Cris. Vamos fazer o seguinte? Eu não conto pra ninguém. Isso fica entre a gente. Mas vamos sair daqui, por favor?
CRIS – Não posso. Meu lugar é junto ao meu povo.
RODOLFO TENTA SE SEGURAR MAS ACABA RINDO.
CRIS – Tá rindo de quê? Só pra você saber: Desde o século II já tinham previsto que a próxima encarnação do divino espírito santo seria uma entidade feminina.
RODOLFO - Quem previu esta barbaridade?
CRIS - O que eu tenho que fazer pra você acreditar em mim?!
RODOLFO – Pra acreditar que você é DEUS? Só um milagre!
CRIS – Que piadinha infame.
RODOLFO - Um milagrinho só, Deus,vai! Ou Deusa?
CRIS – Hã?
RODOLFO - Como que eu devo te chamar? Deus ou Deusa?
CRIS - Como? Sabe que eu não sei? Ainda não recebi instruções.
ROODLFO - Instruções de quem, cara pálida? Se você é Deus, quem é teu chefe?
CRIS – Rodolfo!
RODOLFO - Deus mulher?!!! Caramba, vocês piram mesmo.
CRIS – Ai! Sabia que você ia tocar nesse ponto! Estava só esperando! Nós já conquistamos tantas coisas, meu bem. Nós somos a maioria da população mundial, a maioria no concurso do ENEM, a maioria nas aulas de dança de salão do Jaime Aroucha. Já somos até Presidente da República. Chegar a Deus é um caminho natural. Não acha?
RODOLFO – Claro. Era o que estava faltando no currículo de vocês.
CRIS - Vem cá, eu senti uma ponta de deboche na sua entonação de voz?
RODOLFO – Eu?
CRIS - Sarcasmo?
RODOLFO - Imagina.
CRIS - Despeito.
RODOLFO - Longe de mim. Eu só acho que.
CRIS - Que?
RODOLFO - é...
CRIS - Completa a frase, Rodolfo.
RODOLFO – Eu só acho que é...
CRIS - Desenvolve.
RODOLFO - Eu só acho que é muita...
CRIS – Dá continuidade, Rodolfo!
RODOLFO – Se você me deixar falar! Eu só acho que é muita responsabilidade!
CRIS – Ah, quer dizer que pra você eu não estou preparada para a missão?!!!.
RODOLFO - Eu não disse isso!
CRIS – Não disse, mas ia dizer. Eu sei muito bem aonde você quer chegar.
RODOLFO – Qual, é, Cris? Só porque é Deus acha que pode ler pensamentos?
CRIS – Você nem imagina do que eu sou capaz.
RODOLFO – Ai que medo!
CRIS - Se eu fosse você tomava cuidado mesmo.
RODOLFO – Tá me ameaçando?
CRIS - Só te dando um toque.
RODOLFO – Quem você pensa que é?
CRIS – Você sabe com quem está falando?
RODOLFO – Você tá se sentindo, né? Quer conhecer uma pessoa, dê poder a ela!
CRIS – Você não vai gostar de ver Deus irritado!
RODOLFO – O mundo tá perdido.
CRIS – Hã? Eu não ouvi direito. Dá pra repetir?
RODOLFO – Eu disse que “Deus” devia escutar melhor.
CRIS - Você está querendo insinuar que eu não tenho competência para o cargo, Rodolfo?!!!!
RODOLFO – Ai meu cacete! Tô perdendo a paciência.
CRIS – Como? Eu ouvi bem o que você falou?
RODOLFO – Ouviu. Eu falei: “Ai meu cacete”!
CRIS TIRA UM BLOQUINHO E UMA CANETA DA BOLSA OU DE UM BOLSO NA ROUPA E ANOTA ALGUMA COISA. RODOLFO ESPIXA O OLHO.
RODOLFO – O que você está fazendo?
CRIS – Anotando, ué!
RODOLFO – Isso eu estou vendo. Mas anotando o quê?
CRIS – Estou debitando da sua conta.
RODOLFO – Conta? Que conta?
CRIS – Um novo método que eu vou implantar: Cada ser humano terá uma conta pessoal e intransferível. À medida que for cometendo pecados, Deus vai subtraindo a pontuação dos seus créditos. Cada pecado cometido corresponde a um número de pontos perdidos, de acordo com a tabela divina. Depois de somar todos os pecados, subtrair dos seus créditos, chega-se à sua média final que, dependendo do número, te dá condições de você ir, ou não, pra lá. (CRIS APONTA PARA O ALTO).
RODOLFO – Como é que é?
CRIS – Nunca ouviu falar no juízo final, Rodolfo?!!!
RODOLFO – Quer dizer que pra ir pro CEU eu vou ter que ter carteira de habilitação?
CRIS – Uma espécie de.
RODOLFO – Só falta a Lei seca.
CRIS – Está em estudos.
RODOLFO – Que absurdo! Você enlouqueceu mesmo!
CRIS - Eu enlouqueci? Vocês vão me agradecer. Eu vou botar ordem nessa bagunça. Nessa pouca vergonha, nessa bandalheira. As coisas vão mudar.
RODOLFO – Por acaso, você está criticando a administração anterior?
CRIS – Não adianta fazer futrica e tentar me colocar contra o meu filho.
RODOLFO – Você tem filho?
CRIS - Não se faça de besta, Rodolfo!
RODOLFO – Juro que não sabia.
CRIS – Já ouvi falar num tal de “Jesus”?! Pois é.
RODOLFO – Tô começando a ficar preocupado. Essa história já foi longe demais.
CRIS – (sentida) Também acho. Eu esperava outra coisa de você.
RODOLO – O quê por exemplo?
CRIS – Apoio, compreensão, FÉ...
RODOLFO – Qual o teu plano de saúde, mesmo?
CRIS – Eu só te digo uma coisa: Quem está torcendo contra, fazendo “vudu” e duvidando da minha capacidade, COMO CERTAS PESSOAS QUE EU CONHEÇO, vai se dar mal.
RODOLFO – Cobertura total? Quarto particular ou enfermaria? Tem Copa Do’r?
CRIS – Eu te odeio!
RODOLFO – Olha que Deus castiga!
CRIS – Palhaço!
RODOLFO - Você é muito infantil.
CRIS – Além de tudo eu sou infantil?
RODOLFO – Você não é infantil. Você é MUITO infantil.
CRIS – Rodolfo!
CRIS COMEÇA A CHORAR.
RODOLFO – Ai meu Deus!
CRIS – Me chamou?
RODOLFO – Esse chá de cueca dá onda mesmo.
CRIS - Pensa que é fácil pra mim? Não é não! Muita pressão. Eu fui pega desprevinida. Eu nem desconfiava. Que eu sou eu. Quer dizer, ELE. Sabe, é um momento difícil. De adaptação. Eu achei que você ia me apoiar.
RODOLFO - Cris, cris, olha pra mim. Não chora, não chora, Cris. Não faz assim. Cris, se controla. Não perde o controle. Engole o choro. Engole o choro. Assim. Isso. Respira fundo. (T) Eu não sei o que aconteceu na sua despedida de solteira, nem quero saber, mas pra mim chega! Acabou a brincadeira.
CRIS – Então empatamos. Pra mim também chega!
RODOLFO – Ótimo, concordamos em pelo menos alguma coisa.
CRIS – Acho que você não vai concordar é com o que eu vou fazer.
RODOLFO – O quê?
CRIS – Que fique bem claro que foi você que me obrigou.
RODOLFO – Do que você está falando?
CRIS – Eu não queria usar os meus poderes. Mas você não me deixou outra alternativa. “Homem sem fé”...
RODOLFO – Ah, deixa de ser ridícula! Será que eu vou ter que te levar à força pra casa?
CRIS – Me larga, Rodolfo! Me larga. (CRIS USA SEUS PODERES) PLIM! Estátua!
RODOLFO REALMENTE FICA PARALISADO. CRIS OLHA E COMEÇA A CANTAR.
CRIS – “Eu sou o seu sacrifício
A placa de contra-mão
O sangue no olhar do vampiro
E as juras de maldição
Eu sou a vela que acende
Eu sou a luz que se apaga
Eu sou a beira do abismo
Eu sou o tudo e o nada.
FIM.
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